terça-feira, 3 de abril de 2007

"Austerlitz" de W.G. Sebald

DANIEL BLAUFUKS - S/Título, da série Terezín, 2006

Austerlitz (2001) foi a última obra editada por W.G. Sebald antes de falecer num acidente de automóvel em 2001. O tema é a vida de Jacques Austerlitz, um professor de História da Arquitectura que casualmente trava conhecimento com o narrador, repetindo posteriormente esses encontros em que vai construindo uma narrativa pessoal sobre o processo de descoberta da sua origem e identidade histórica. Revela como descobriu que, ao invés de ser como acreditava flho de um pastor calvinista galês, era afinal uma criança judia checa enviada para o Reino Unido como forma de escapar à morte certa que a sua mãe encontrou no campo de concentração de Terezín, facto da sua vida que esquecera desde sempre até este vazio inexplicável o vergar emocionalmente.

Este foi um livro que me apaixonou pelos mais diversos motivos. Tem uma construção pouco comum, sem parágrafos e com capítulos enormes, mas a fluidez da narrativa, bem como o uso de imagens para marcar o ritmo da história evitam que este se torne um livro demasiado pesado e maçudo. A linguagem descritiva ajuda-nos a construir imagens vivas que nos transportam directamente para o espaço do livro.
A construção de espaços, caracterizada pela paixão do protagonista pela história da arquitectura, é um modo de utilizar marcadores de memória que vão auxiliar na descoberta/construção de um espaço identitário que estabelece um sentido de pertença e historicidade pessoal.
Jacques Austerlitz surge como um personagem desenraizado, sentimento que esteve sempre presente desde a mais tenra idade, e que apenas é reforçado com a descoberta da sua verdadeira identidade. O sentimento que nos transmite é de uma extrema solidão e melancolia, o que o impede de estabelecer relações profundas e duradoras com quem o rodeia. A relação construída com o narrador é marcada igualmente pela intermitência mas penso que é de uma qualidade diferente pois este foi escolhido como o depositário da sua memória, o garante da sua existência.
Não há dúvida que é um livro marcante e merece todas as críticas que tem recebido.